25 abril 2012

RIFANDO MEU UMBIGO


RIFANDO MEU UMBIGO


Decididamente: de tanto contemplá-lo, enjoei. Ele já me disse coisas demais. Que eu, sabida, transformei em palavras - e ganhei com elas. Nos últimos anos, então, tendo sido forçada a guardar território emprestado e precário (o porãozinho que restou de meu castelo avoengo), sem ter muita companhia, não tive outro remédio senão concentrar-me nessa parte útil, sem dúvida, mas pouco imaginativa, do meu ser. E ouvi-lo de noite e de dia/ padre-nosso ave-maria.
E o que extraí dele...Ciscos e mariscos, memórias e lorotas, solilóquios e circunlóquios (principalmente estes), coisas de somenos e coisas só demais - enquanto o mundo vasto mundo continuava a rolar e a roncar cada vez mais alto, lá fora.
              Mas agora enjoei. Deve haver mais coisas  para se fazer, ó Senhor, do que passar a vida toda e mais três meses a contemplar um mero buraquinho insosso que fizeram quando nascemos, para nos marcar – para que não nos perdêssemos? Para que nos reconhecêssemos como filhos de Adão e Eva?
             Do umbilical domínio já saindo, mais inteligente me pergunto: como podemos descender desse senhor e dessa senhora, se justamente eles é que não tinham umbigo?...
        Onde, em que altura da criação, de qual genitor afinal herdamos esta marca de nosso ser vivente?

A história não está bem contada. Não. Essa história, a da nossa criação, não está nada contada, ainda.
Só nos resta inventá-la.




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